"Vai haver um momento, algures no século vinte um, em que a nossa inquietação cheia de autoilusões vai colidir com o poder tecnológico em constante crescimento. Uma área em que isto vai acontecer é a zona de contacto entre a nanotecnologia, a biotecnologia e a tecnologia informática."
In Introdução de Michael Crichton ao romance "Presas"
Após quase 20 anos voltei ao norteamericano Michael Crichton, autor do famoso Parque Jurássico que deu origem a vários filmes. Enquadro o romance "Presas" no género de suspense e especulação dos ricos da evolução tecnológica e científica atual sobre a Humanidade por perda de controlo ou falta de ética do seu uso.
Jack Forman é um programador informático que perdeu o emprego devido a princípios éticos, passando a tomar conta dos seus 3 filhos em casa, enquanto a mulher, Júlia, está a desenvolver um projeto em nanotecnologia noutra empresa que pretende revolucionar a medicina com a introdução no sangue de câmaras de filmar inteligentes. Jack começa a desconfiar do comportamento da esposa, um dos seus filhos desenvolve uma doença estranha, Júlia sofre um acidente em circunstâncias dúbias e ele é contactado do ex-emprego para cooperar num programa informático que está a ter resultados indesejados. Ele descobre que é o mesmo associado ao projeto de nanotecnologia da mulher. Uma oportunidade para descobrir o que há de estranho com ela e o pedido de auxílio vindo de quem o despedira, pelo que aceita. Vai para o laboratório no deserto e percebe que a equipa perdeu o controlo daquilo que criara, a tecnologia ameaça o criador e a Humanidade.
O estilo narrativo é de um relatório quase horário de uma semana de acontecimentos, expostos de forma muito cinematográfica, sem grandes artifícios estilísticos que desviem a atenção, mas com diversos diálogos fáceis e informações acessíveis de conhecimentos científicos que mistura teorias reais com aspetos especulativos que apoiam a hipótese da trama, com uma sucessão de momentos inesperados que geram suspense em cadeia que prendem o leitor e o levam a suspeitar do perigo que espreita as personagens, a própria humanidade e a necessária luta entre os que permanecem livres e os reféns da criatura criada que evolui com a sua inteligência artificial (na obra distributiva).
Crichton nem sempre foi bem recebido pela cultura literária dominante e woke, chamou a atenção de determinados excessos para refrear excessos e talvez, nalguns casos, fosse mesmo negacionista. Contudo, sou um admirador da literatura que concilia a especulação científica em obras de suspense e terror e já há muito tempo que nenhum romance me prendia tanto à leitura como este.
Para quem viu ou leu Parque Jurássico e gostou, aqui está outra obra que agarra o leitor com a mesma fórmula e, apesar de ser ficção, leva-nos a pensar sobre as ameaças que a ciência pode trazer se não for eticamente controlada pelo investigador ou patrocinador. Tudo o que li deste autor neste domínio adorei. Presas não foi exceção.