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domingo, 11 de janeiro de 2009

A LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA DAS ILHAS VULCÂNICAS III: o Recuo da Linha de Costa 1

As escoadas de lava que saem dos vulcões espraiam-se ao chegar ao mar, formando muitas vezes deltas lávicos, mas esta lava arrefecida, que parecia constituída de material consolidado, rígido e compacto, vai sofrer uma alteração química contínua, provocada pelos sais dissolvidos na água e pelos seres vivos que se fixam nestas rochas, bem como erodida pela persistente rebentação das ondas.
Pequenos deltas lávicos e plataformas de abrasão marinha em São Jorge (Manadas), com o Pico e o Faial ao fundo.

Como para auxiliar o efeito da acção do mar, associa-se a este processo a movimentação dos grãos de areia e dos blocos de calhau, em virtude da energia da ondas. Este chocar contínuo tem um efeito abrasivo sobre estas lavas, que assim vão sendo destruídas lenta e progressivamente, formando-se superfícies planas que o mar vai galgando cada vez mais e denominadas de plataformas de abrasão.
Uma fase muito inicial de formação de arriba costeira sobre uma escoada lávica.

A erosão e a abrasão marinha conduzem ao recuo da linha de costa e à destruição da própria plataforma, submergindo-a, pois os grãos arrancados à lava são transportados e sedimentados no fundo do mar. Então, como para o interior da ilha a altura da escoada de lava é maior, surge um pequeno degrau, a arriba costeira (vulgarmente designada nas ilhas apenas por rocha) que marca a zona onde a superfície da escoada já não é tão frequentemente galgada pelo mar. Só que o oceano não desiste...
Um estado mais avançado de uma arriba costeira sobre lava consolidada e rígida, vendo-se um recife à direita como testemunho do recuo da linha de costa.

O degrau continua a ser agredido pelo mar, a linha de costa lenta e progressivamente recua sempre mais, enquanto a altura da arriba costeira se torna cada maior. Por vezes, em zonas onde a lava resistiu, formam-se pequenos ilhéus ou recifes em torno da ilha, entre os quais a passagem de pequenas embarcações faz parte das aventuras dos passeios litorais no Verão açoriano.
Mas nem sempre o litoral vulcânico é constituído de lava consolidada e rígida, alguns dos materiais expelidos pelos vulcões são suaves, mas o mar não tem compaixão das rochas brandas, só que isso fica para um próximo post.

10 comentários:

Tibério Dinis disse...

Fantástico, nunca tinha pensado nisso. De facto, as formações são diferentes, pensava que era por serem sempre assim.

Haja Saúde

Maria Silva disse...

É um fenómeno bastante fácil de observar em S. Jorge e no Pico, No concelho de São Roque, há várias e muito fáceis de visualizar.

Carlos Faria disse...

ao Tibério
Na terra nada é constante, nas ilhas vulcânicas a velocidade da mudança é rápida, a tua Lajes e as serras que a delimitam estão em permanente mudança, algumas bem bruscas como as que se observaram no século XIX na tua freguesia, mas isso fica para bem mais tarde, quando um dia falar da geologia da terceira. Enquanto a maioria vê a paisagem de hoje, um geólogo vê nela o resultado de uma história longa, cheia de peripécias que dariam grandes romances.

à nanda
efectivamente, a evolução do litoral em grandes escoadas basálticas está muito exposta no pico e em são jorge, por serem zonas de ligação a povoações costeiras... mas faça uma viagem entre a fajã da praia do norte até ao varadouro pelo litoral e verá muita coisa que se julga não existir por cá... algumas até bem mais perto da horta como pretendo mostrar brevemente.

Anónimo disse...

Vejo que voltaste à geologia em força.
De facto, e fazendo minhas as palavras do Tibério, depois de conhecer a explicação geológica, vê-se a paisagem com outros olhos.

Carlos Faria disse...

ao paulo pereira
claro que voltei às ciências da terra. Os post de geologia, mesmo sem ser os mais comentados, são no histórico do blog aqueles que continuamente recebem mais visitas e os seus temas são sempre os mais procurados no google.
Como este blog é de divulgação científica, cultura e ilhas, a geologia tenderá tempos a tempos a marcar o seu terreno e compreender a nossa região só faz bem.

Grifo disse...

muitos desses sítios são um paraíso para algumas espécies marinhas açorianas... tudo é um ciclo... e a erosão não é propriamente um problema.

Carlos Faria disse...

ao grifo
é um problema sim senhor... tenta encontrar lapas em torno dos capelinhos e depois vê no próximo post uma justificação para isso.
o que tu queres dizer é que mesmo assim, há algumas espécies que se adaptam a estas condições, mas a biodiversidade do ecossistema tende a ser inversamente proporcional à sua instabilidade. aliás, a orla costeira açoriana não é um exemplo de grande diversidade biológica e a energia das ondas tem nisso uma grande culpa, mas existem também outros factores, como a distância a outras margens costeiras que dificulta alguma migração até cá.

Carlos Faria disse...

bem... as lapas são raras hoje em qualquer costa açoriana... e não apenas nos capelinhos, estava a pensar no passado. mas existe outro motivo para a raridade hoje que não se relaciona com a erosão, nem com o facto de eu não gostar do seu sabor.

Grifo disse...

relacionasse com o facto de muitos gostem do seu sabor... e irem apanhar sem licenças e etc...

Eu isso não acho... agora á muitas invasoras marinhas, que andam a destruir muitas coisa, mas nos sítios onde ainda não chegaram, é uma maravilha... vi da diferença de dois anos no porto dos cedros, assim como em outros sítios quando vou lá... mergulhar (observação)

Carlos Faria disse...

ao grifo
Não. o que eu quis chamar à atenção, no primeiro comentário para ti foi: as lapas são muito mais raras em torno dos capelinhos do que nas restantes costas da ilha, porque a erosão lá é rápida, como se vê no post já publicado.
Contudo, adicionei a seguir que de facto a diferença não é notória hoje em dia, por as lapas escassearem em toda a costa, mas o motivo era agora a sua apanha e não a erosão, mas antigamente a diferença era grande. Efectivamente, não gosto de lapas cruas e grelhadas nem por isso... coisa rara nos açores