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quinta-feira, 30 de maio de 2019

"A Cartuxa de Parma" de Stendhal


Excertos
"A presença do perigo dá génio ao homem sensato, põe-no, por assim dizer, acima de si próprio; ao homem de imaginação inspira romances, ousados, é certo, mas o mais das vezes absurdos."

"nos países em que os grandes nomes não são nunca castigados, a intriga é toda-poderosa mesmo contra eles."

O romance "A Cartuxa de Parma" de Stendhal é um dos clássicos da literatura de França escrito a seguir à queda de Napoleão e apesar de os ideais da revolução atravessarem todo o livro e de parte da estória ocorrer sob o domínio deste imperador, grande parte da obra passa-se no reino de Parma, com um soberano fictício que impõe um regime absolutista e onde os jacobinos são considerados inimigos do Estado.
Fabrício nasceu de uma família nobre e aliada ao império austríaco em Milão, mas foi sobretudo educado pela tia paterna, ligada às causas napoleónicas durante a tomada da cidade, desta situação resultará numa pessoa idealista, ingénua e inadaptada à vida numa sociedade que depois voltou a ser regida pela intriga da aristocracia absolutista. Cai assim em situações de risco e de conflito entre os influentes conservadores que passam governar quando jovem e adulto, adversário do próprio pai e apenas protegido pela tia, que alcança o cerne do principado de Parma, e pelo alto clero desta que convive em promiscuidade com os interesses em sociedade. Para agravar mais isto, ele não só se apaixona de forma deslumbrada com facilidade como desperta amores nas mulheres, o que alimenta ciumes, rivalidades e vingança nos homens da corte e do povo.
Stendhal escreve bem ao estilo do século XIX, cruza na narrativa factos históricos com personalidades da época fictícias e serve-se do agir impulsivo das suas personagens para salientar diferenças de mentalidade, sentimentalidade e de comportamentais entre os franceses e os italianos, estes então divididos por diferentes pequenos reinos, envenenados pelas intrigas na corte, a aristocracia está habituada a sair impun de crimes sociais mas sempre em risco no que concerne a ideias políticas devido às instabilidades dos reinados e alianças oportunistas.
Fabrício torna-se numa personagem quixotesca cuja ingenuidade o embrulha em teias de conflitos políticos, direitos dos privilegiados, intrigas de alcova, promiscuidade entre igreja e Estado e tudo isto agravado pela sua jovialidade, beleza e romantismo, que servem a Stendhal para denunciar vícios sociais, as imoralidades, o abuso de poder absolutista e onde o clero em nada se distingue em interesses, castidade e ética dos cortesãos.
O livro está dividido em duas partes, na primeira, sobretudo em Milão sob o domínio napoleónico e dos ideais revolucionários, onde Fabrício cresce imaturamente e sonhador, até assiste à batalha de Waterloo. A segunda é mais centrada numa Parma absolutista, onde ele fica preso nesta teia e em risco de morte permanente, sendo que a imaginação de Stendhal o levou a estender a narrativa que a partir de certo momento se torna, como ele mesmo define no excerto acima, ousada e absurda, cheia de momentos rocambolescos e excesso de sentimentalismo.
Para conhecer o valor literário de Stendhal prefiro outro clássico dele que é a obra-prima que falei neste artigo. Um começo que cativa e motivador mais depois vai-se tornando fastidioso e lento no avançar da trama até ultrapassar as 500 páginas.

2 comentários:

Pedrita disse...

esse do stendhal eu não li. eu gostei de o vermelho e o negro, mas li há anos demais. pena q eu sou muito reticente a releituras. beijos, pedrita

Carlos Faria disse...

Também tenho muita resistência a releituras, até porque há obras interessantes que deveria reler.
Gostei muitíssimo de O Vermelho e o Negro, deste fui perdendo parte do gosto, apesar de ter gostado muito do início.