Páginas

terça-feira, 15 de agosto de 2017

"Reino do Amanhã" de J. G. Ballard


Terminei a leitura do "Reino do Amanhã" do escritor inglês J. G. Ballard, uma distopia que evidencia os risco presente de escravatura e de ditadura que pode resultar da combinação do consumismo atual com o desporto interesseiramente organizado nas comunidades, neste caso a região suburbana de Heathrow - Londres, onde apenas há valores para uma sobrevivência oca e materialista sem as referências coletivas tradicionais.
Na sequência de um tiroteio num megacentro comercial em Brooklands é morto o pai de Richard Pearson, um publicitário recém-despedido e este desloca-se à periferia onde descobre um aglomerado habitacional descaracterizado cuja vida se desenrola em torno da autaestrada e das grandes superfícies comerciais: "uma estação de serviço junto a uma estrada com duas faixas de rodagem imprimia um sentido de comunidade mais profundo que qualquer igreja ou capela, uma maior consciência de cultura partilhada do que uma biblioteca ou uma galeria municipal poderiam oferecer... ...o estacionamento estava prestes a tornar-se uma das maiores necessidades espirituais da população britânica."
Na cidade, Pearson descobre o mal-estar do subúrbio, aproveitado pelo Metro-Centre com publicidade incutida à população articulada com equipas desportivas suportadas por aquele templo do consumo e geradores de uma violência oca e xenofobia em espiral crescente e onde o pai ora pareceu uma vítima ora uma peça eliminada quem fomentava uma revolução e guerrilha em Brooklands.
Pearson decide mudar-se e investigar o fenómeno e a morte, alia-se tacitamente ao Metro-Centre e, numa evolução do vazio, a loucura da ditadura consumista instala-se como uma nova religião, extrema-se em revolta com exércitos civis em defesa do seu deus comercial e um Estado sujo que procura conter uma situação descontrolada.
A obra evolui para uma tensão extrema e denuncia a violência das periferias urbanas, torna-se sombria e repetitiva na demonstração exaustiva da semelhança entre os crentes desta nova religião do consumo com o desporto organizado através dos seus símbolos e ritos paralelos às fés tradicionais... mas "As pessoas são capazes da mais maravilhosa demência." uma obra atual da sociedade numa evolução mais sombria que a do "Admirável mundo novo" de Huxley. Um romance, com uma escrita crua, por vezes ácida, que incomoda pela denúncia do caminho que estamos a seguir. Um alerta contra a alienação em que o ocidente consumista está a cair.

6 comentários:

Pedrita disse...

deve ser bem interessante. fiquei curiosa. mesmo que seja mais deprimente por mostrar os rumos q podemos seguir. beijos, pedrita

Carlos Faria disse...

Há obras que valem pela sua beleza, pelo prazer que despertam, mas esta é daquelas que vale pelo incómodo de nos pôr a pensar sobre o nosso modo de vida atual.

Kelly Oliveira Barbosa disse...

Interessante Carlos, gostei dessas breves reflexões que você fez.

Carlos Faria disse...

Um romance que mostra muito bem que a dose de laicidade não religiosa que é cultivada na sociedade moderna leva a que o Homem procure outros deuses, neste caso o consumismo e o desporto.

Kelly Oliveira Barbosa disse...

Interessante Carlos, mesmo interessante.

Não reconheço essa palavra "Desporto", ao que se refere realmente?

Carlos Faria disse...

Desporto é a palavra em Português europeu que no Brasil é substituída por Esporte