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sexta-feira, 9 de maio de 2008

ESPÍRITO SANTO - VS GEOLOGIA E LENDAS

Neste fim-de-semana completam-se 50 dias após a Páscoa e celebra-se no cristianismo o Pentecostes, a vinda do Espírito Santo, o Paráclito (o advogado dos homens enviado por Deus). A festa mais característica do Cultura Açoriana, não só por ser de cariz religioso, mas sobretudo por, expontaneamente, partir do povo de todas as ilhas e freguesias do Arquipélago e com tal intensidade que foi imposta ao clero nos moldes definidos pelos ilhéus e não o inverso.



A força das festas do Espírito Santo radica na necessidade do Açoriano ter um protector ou defensor contra os sismos, vulcões e intempéries, pelo que talvez seja esta a celebração religiosa em Portugal mais marcada pelos condicionalismos geológicos do que qualquer outra, por isso não admira que em paralelo circulem os numerosos "milagres" que justificavam o agrado do Divino perante esta oferenda do Povo.

A festa do Espírito Santo é sobretudo uma celebração da esmola e da partilha de alimentos, não só pelos mais necessitados, mas também pelos que estão mais próximos, os habitantes da mesma localidade e os amigos. São organizadas através instituições - irmandades, que entre si e num sistema diversificado seleccionam o irmão que organiza a festa em cada ano.


O Espírito da Santo é simbolizado por uma coroa imperial e um estandarte, a festa é precedida pela dádiva de esmolas (num ambiente mais privado) no dia ou na véspera, prossegue com um cortejo da casa do organizador da festa - mordomo, em direcção à igreja, onde é, frequentemente, invocado o Espírito para protecção através da imposição da coroa sobre o mordomo ou familiar.

Terminada a cerimónia religiosa segue o cortejo novamente para o local sede da irmandade - o Império, embora noutras ilhas possa possuir outros nomes como Treato (3 actos, de 3 dias de festas ou terceira pessoa da Trindade).

No império a coroa é colocado no altar e o mordomo serve uma refeição a todos os membros da irmandade e convidados em louvor do Divino, com Sopas do Espírito Santo, cujo corpo central da receita é comum às várias ilhas, massa sovada (uma espécie de pão doce rico em ovos, limão, especiarias e manteiga), arroz doce e vinho, a festa pode prosseguir com os arraiais típicos das festas rurais.
Relatos de correntes de lava que se desviaram perante a exposição da coroa do Espírito Santo, escoadas lávicas que bifurcaram de modo a manter vivo o gado destinado às esmolas e às sopas, crises sísmicas que não afectaram os locais onde se encontrava a coroa, milagres de multiplicação das sopas de mordomos perante um número inesperado de presenças e protecções asseguradas contra o galgamento do mar em tempestades devido à intervenção Divina, abundam em todas as ilhas, alguns casos facilmente explicáveis, outros nem por isso, histórias que misturam a lenda com a realidade do passado que mantém viva a fé neste culto, mas sobretudo que importa recolher e guardar por fazerem parte do Património Imaterial da Cultura Açoriana.

6 comentários:

Lc disse...

Existem muitas festas religiosas por aí, mas a sensação que esta transmite, é única. Aqui vemos fé autêntica, pura e profunda devoção a uma Entidade que está intimamente ligada ao Açoriano.
Pelo menos nesta altura, todos vivemos como verdadeiros irmãos, onde a partilha e o convivio se faz da forma mais natural possivel.
A unica coisa no meu ponto de vista, que é de lamentar é o exagero no aproveitamento das sopas do Espirito Santo, para arrecadar dinheiro para obras e sei lá mais o quê, ao longo do ano...

Os Incansáveis disse...

Aqui no Brasil, ela é conhecida como a Festa do Divino. O Ivan Lins, compositor brasileiro, até compôs uma música sobre a festa:"Os devotos do Divino vão abrir sua morada pra bandeira do Divino ser bem-vinda, ser louvada..."
Acho que a tradição só existe ainda em cidades pequenas do interior.
Denise

Carlos Faria disse...

ao lc
a mim não me choca a realização de pequenas festas com ementa das Sopas dos Espírito Santo para anagariar fundos, desde que estas celebrações sejam feitas fora do contexto das festas regulares da irmandade. Choca-se quando alguma irmandade no dia de cumprir o seu voto comercializa a sopa pois isso é uma subversão da festa e já vi acontecer situações dessas.

a os incansáveis
sei que as festas do Divino ocorrem nos estados do sul do Brasil, nomeadamente Santa Catarina, onde houve uma emigração muito forte de açorianos nos séculos XVIII e XiX e introduziram estas celebrações que ainda hoje são culturalmente muito fortes, noutros estados não sei.

José Quintela Soares disse...

Quem me dera umas Sopas....

O ano passado, apesar da chuva, "consolei-me"....

Abraço picaroto.

Anónimo disse...

nós temos algumas cidades no Brasil que fazem festas como essa. paraty no estado do rio de janeiro é uma delas. não conheço esse livro que terminou de ler. beijos, pedrita

Carlos Faria disse...

ao josé quintela soares
pois eu nestes dias tenhos sempre várias alternativas para saborear umas sopas, mas por norma fico-me pelo império amarelo da Ribeirinha (o da foto) por pertencer à direcção da irmandade.

pedrita
no brasil sei que a tradição existe nalguns locais, sobretudo onde existe uma diáspora açoriana, mas não só.
Quanto ao livro acabado de ler, é provável que não exista qualquer tradução em português, por ser um escritor canadiano (canadense se preferir) que embora premiado no país, representa a voz da minoria anglófona no quebec, o que o torna um pouco difícil fora do canadá, mas foi um dos livros mais premiados no início deste milénio e muito interessante, uma "autobiografia" de uma pessoa de mau feitio mas que se torna simpático pela forma de escrita e pela doença de alzeihmer que sofre.