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sábado, 17 de janeiro de 2009

O FIM DA LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA DAS ILHAS VULCÂNICAS IV: A Teoria do Ponto Quente - Hot Spot

As ilhas vulcânicas desde o seu início estão condenadas a desaparecerem, porque a erosão tende continuamente a desmantelar o cone vulcânico a partir do seu topo, enquanto o recuo das arribas reduz a área da ilha, mas existem mais razões para isso.
Corvo, a menor ilha dos Açores corresponde a um cone de um vulcão muito erodido, embora não deva ter atingido grandes dimensões, a ilha já foi bem maior do que hoje (foto de angrense retirada daqui)

As ilhas, apesar de terem o seu exterior à temperatura ambiente, em profundidadeas rochas estão aquecidas pelo calor do vulcão, que as dilata. Com a extinção deste, aquelas arrefecem ao longo de milhares de anos, contraiem-se e tornam-se mais densas, reduzindo assim o volume global da ilha...
Caldeirão do Corvo, as paredes oeste desta caldeira (à direita na foto) contactam hoje directamente com a arriba costeira, demonstrando que todo o flanco ocidental do vulcão já foi erodido (foto de angrense retirada daqui)

O próprio fundo do mar, feito de rochas vulcânicas, desloca-se como uma passadeira rolante a partir das cristas oceânicas, onde se forma, e arrasta consigo as ilhas. Ao longo da viagem, estes fundos também arrefecem, contraiem-se e vão-se afundando, submergindo ainda mais a ilhas inicialmente tão imponentes.
Os ilhéus das Formigas, com idade próxima das ilhas mais antigas dos Açores, são os restos de um vulcão e do que terá sido uma ilha no passado (foto de F. Tempera, proveniente e nas condições mencionadas aqui)

Assim, ao longo de milhões de anos, com o "envelhecimento" das ilhas e o arraste dos fundos aceânicos, os vulcões deslocam-se do local inicial da sua formação, onde se situava a fonte do magma que os alimentava e extinguem-se, progressivamente os edifícios vão sendo erodidos e submergem com a descida dos fundos marinhos. Transformam-se novamente em Montes Submarinos, enquanto ilhas mais jovens voltam a surgir na zona inicial. Este fenómeno gera os arquipélagos e alinhamentos de montes submarinos, estes ficam menores com o aumento da distância ao local onde se formaram.
Formação de um alinhamento de ilhas e montes submarinos com a deslocação dos fundos oceânicos sobre uma fonte de magma em profundidade e sensivelmente fixa (esquema daqui).

Os Açores situam-se hoje junto à crista oceânica do Atlântico, numa área de fundos marinhos pouco profundos e onde existe uma fonte de magma em profundidade, mas há indícios que outras ilhas muito mais antigas e irmãs deste arquipélago já existiram, encontrando-se montes submarinos presentemente a milhares de quilómétros daqui, junto ao mar da Terra Nova (Newfoundland), no Canada.
Montes submarinos próximos da Terra Nova, que segundo alguns correspondem às ilhas mais antigas formadas na região dos Açores ( imagem daqui).

A confirmar-se esta teoria para os Açores, as nossas ilhas, tal como as do Havai, correspondem aos vulcões mais jovens de um vasto alinhamento de muitos outros vulcões extintos e já submersos, que se extendem por longas distâncias nos fundos oceânicos, reflexo de uma actividade vulcânica que já perdura por centenas de milhões de anos e, provavelmente, por cá novas ilhas surgirão num futuro mais ou menos distante.
Batimetria do Atlântico com os Montes Submarinos dentro do traço a vermelho e os Açores dentro do amarelo (imagem daqui e adaptada).

Os locais sensivelmente fixos à superficie do planeta que alimentam um vulcanismo por muitos milhões de anos e originam este tipos de alinhamentos de cones, são frequentemente designados por Pontos Quentes, tradução do inglês, Hot Spot.
Existem Pontos Quentes nos Oceanos e nos Continentes e muito provavelmente os Açores devem a sua existência à presença de um deles nesta área do Planeta Terra e a confirmar-se a teoria, umas ilhas poderão desaparecer, mas novas deverão surgir e os Açores continuarão a existir por muito tempo.

Bibliografia consultada para os hot spot e teoria dos montes submarinos associados aos Açores: Hamblin, W. K. & Christiansen E. H.; "Earth's Dynamics Systems" Prentice Hall Ed.

12 comentários:

Grifo disse...

mesmo sendo a formação por movimento de placas a actividade vulcânica continua em varias ilhas...

É muito confuso, o pico é a ilha mais jovem, é bem notável pelo tipo de rocha e o numero e tamanho das suas arribas (pouco xD).

Mas a ultima manifestação de vulcanismo não ocorreu lá...

Carlos Faria disse...

ao grifo
O Ponto Quente, é mais uma mancha ou área quente, por isso é possível ter vários vulcões activos numa zona não muito vasta. Além disso, a fonte de magma em profundidade alimenta várias câmaras magmáticas menos profundas na área, cada uma com as suas dimensões, ciclos e evoluções próprias.
Quando tu vês à escala do globo, a área já não é tão extensa quanto isso e a média idade das ilhas vai aumentando com a distância ao "ponto" quente ao longo do tal alinhamento, que também não é tão estreito e em fila indiana como nos desenhos.

Rogério Paulo Pereira disse...

Obrigado pelos posts tão interessantes que tenho acompanhado em silêncio. Continue.
Bom fim de semana

Os Incansáveis disse...

Sou como Rogério: estou acompanhando estes posts e achando muito interessantes.
Denise

Carlos Faria disse...

ao rogério
Já vira que seguia o blog, venha sempre é bem-vindo, não falo só de geologia: a cultura, a minha comunidade, a terra natal e a divulgação das ilhas, entre outros, também são temas, tudo em função da minha disponibilidade, do acervo fotográfico e dos acontecimentos que surgem.

à denise
pois para uma ambientalista que já trilhou geologia é normal que passe por cá e tenho muito gosto, também passo pelos incansáveis com frequência.

Anónimo disse...

Gostei do Geocrusoe, muito bom.

ematejoca disse...

Estas curiosidades geológicas sao muito informativas, mas confesso, antes de ler os seus artigo sobre o tema, nao tinha a minima ideia da possibilidade de algumas ilhas desaparecerem e de novas surgirem. Incrível!

Como nao sei se volta ao blogue. Voilá!
A autora do texto é a jovem Mariana Silva -
menina. trabalhadora. estudante. caloira. mulher -
Com um clique no nome entra no blogue dela.

A neve derreteu, e a chuva voltou!

Carlos Faria disse...

ao mb
obrigado, eu também gosto do seu blog, passo por lá silenciosamente por norma.

à ematejoca
já lhe disse antes, passo sempre depois no blog onde deixei comentário, para ver se teve resposta ou gerou outros comentários.
Relativamente à informação geológica, ete blog faz divulgação científica e é muito consultado também por alunos e professores em vários países que falam a língua de camões, é portanto um fornecedor de conteúdo geológico na net em português.

Paulo Pereira disse...

O Geocrusoe é um blog de qualidade reconhecida.
Contudo, dou-te os parabéns por este post.
Ao ver as imagens dos "Montes submarinos próximos da Terra Nova" não deixo de sentir um arrepio porque, afinal, poderá ser o destino dos Açores (nomeadamente das Flores e Corvo) daqui uns milhões de anos.
Já agora, o mesmo poderá dizer-se de alguns montes submarinos da margem Este do Atlântico, ou não?

Carlos Faria disse...

ao paulo pereira
Eu já pensei nessa questão,esta relação descobria no livro citado e lá não se encontra nada no sentido oposto, nem eu encontrei estruturas que pudesse dizer que deveria corresponder ao mesmo alinhamento do lado euroasiático: Julgo que a madeira (as canárias seguramente) estão relacionadas com outro hot spot.
Não sei se alguns bancos no eixo açores gibraltar têm origem em vulcanismo ou se são apenas resultado de cavalgamento alpino...
Também me questionei pelo facto de grande parte do vulcanismo nos açores estar a Este de rifte e não encontrei elementos sobre a possibilidade de ter havido alguma migração do ponto quente ou do rift, embora se saiba que houve alterações no regime de tensões nos últimos milhões de anos...
efectivamente estava à espera de este post gerar troca de impressões com mais gente, mesmo alguma polémica, mas penso que poucos apanharam as dicas postas à discussão, apenas tu de um modo e o grifo noutra questão pertinente.
Ou terá sido medo de lançarem polémica científica? Da discussão pode surgir luz ou esclarecimentos.

Anónimo disse...

E o rift da Terceira, como se enquadra na teoria dos "hotspot"?

A verdade é que a existir um hotspot nos Açores, as ilhas dos gupos central e oriental teriam como zonas mais recentes a sua zona ocidental.
Ora se isso acontece no Pico (cone do Pico), Faial (Capelinhos) e S. Jorge (Rosais), não acontece em S. Miguel e na Terceira, onde o vulcanismo recente se desenvolve numa faixa N-S sensivelmente a meio do corpo insular.

Apesar de antiga, acho a teoria do Prof. Frederico Machado mais plausivel.

Carlos Faria disse...

ao anónimo
embora não goste de falar com anónimo, a pergunta que fez qualquer um pode discutir abertamente e em ciência não nos devemos esconder, qualquer forma, como todos sabem quem está por detrás de geocrusoe, eu respondo.
O hotspot é uma área à superfície da crosta à escala da Terra e não um ponto como aparecem nos mapa-mundi.
Nesse aspecto não há nenhum problema à escala de ilha, pois estas são demasiado pequenas para se poder falar de variações de idade intra-ilha neste processo. Neste momento, praticamente todo o grupo central e parte do oriental estariam sobre esse ponto quente.
Em termos de escala açores, existe uma tendência das ilhas orientais serem mais antigas que as do grupo central, o que seria lógico neste modelo. dentro do grupo central existe alguma dispersão, mas estas estão relativamente próximas entre si para permitir isso, qualquer forma, o vulcão central mais recente emerso situa-se no pico, perto zona ocidental deste grupo e o mais antigo parece ser na terceira, mais a oriente, logo a tendência manter-se-ia.
paralelamente o faial está muito próximo do rifte, logo é provável que no grupo central haja também interferência do ponto quente com a fonte de magma do rifte, além das interferências resultantes do campo de forças devido ao movimento de placas.
o maior problema do modelo de frederico machado é que o vulcanismo fissural nas ilhas é perpendicular ao modelo teórico do professor, logo faial-pico, são jorge, zona do mistério dos negros na terceira e dos picos em são miguel não podem ser troços de rifte porque se desenvolvem essencialmente WNW-ESE e o rifte seria quase N-S.
Mas há um problema, como conciliar as flores e o corvo? os montes submarinos da terra nova? O hot spot mudou de sítio? terá sido o rifte? desafios que ainda não obtive resposta de ninguém nem vi documentos que explicassem a situação e o esclarecer das dúvidas é uma das coisas que mais me fascina na geologia...