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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

"A Alma dos Ricos" de Agustina Bessa-Luís


"A Alma dos Ricos" de Agustina Bessa-Luís é o segundo livro da trilogia "O Princípio da Incerteza", apesar de ser a primeira obra desta série que eu leio, esta constitui por si só um romance completo e por isso não carece da leitura do anterior para o degustar com prazer.
O romance narra a vida de Alfreda através de várias personagens que viveram próximas dela. A protagonista, filha de uma família rica e tradicional do norte de Portugal, mistura a importância da herança aristocrática com a riqueza burguesa. Uma mulher original que não se comporta como as outras de igual estatuto social, alguém que se descobre estéril, que faz um casamento de conveniência que assume o seu papel de esposa, para quem o sexo não é uma força que a move, mas tem a ambição de ser visitada pela Virgem Maria, pois sente-se mais habilitada para a receber condignamente do que os habituais videntes a quem lhe quer fazer uma perguntas...
Alfreda discute com um mestre de história hebraica e um padre o estatuto social da família de Maria, - cujos indícios a partir de apócrifos e de líderes históricos cabalistas contemporâneos Dela apontariam ter um estatuto social, económico e cultural elevado no tempo de Herodes e haver os sinais que tal origem se refletiria no modo de agir de Jesus. Apesar de se questionarem assuntos da vida das personagens centrais do catolicismo e de por vezes estes serem abordados de uma forma totalmente humana e parecerem roçar heresias na doutrina religiosa, não é uma obra que fira a moral ou o catecismo dos crentes.
Estas dissertações ensaístas no romance não impedem que Agustina faça também uma caracterização da vida social das famílias dominantes de entre Doutro e Minho e as mudanças nestas ao longo do século XX, sobretudo após a revolução de Abril, com uma denúncia dos vícios públicos e privados dos diferentes estratos que coabitam esta região do País. É uma obra que mostra de facto a "alma do norte".
Gostei muito, embora o texto seja de fácil leitura, a densidade de informação, o lento desenrolar da história, o tom introspetivo e a profundidade de alguns temas tornam o romance mais destinado a apreciadores de ensaios e ficção profunda do que a apreciadores de literatura ligeira como um mero passatempo.

4 comentários:

Pedrita disse...

aguardava ansiosamente essa resenha. anotadíssimo. beijos, pedrita

Carlos Faria disse...

O livro mais famoso dela é A Sibila, também li, é o retrato de uma mulher mais forte ainda que luta contra tudo o que é preconceito numa sociedade liderada por homens. Recomendo-o também.

Denise disse...

Interessante!
É a A Sibila que pretendo ler em breve :)

Boas leituras!

Carlos Faria disse...

Os 3 livros que li de Agustina gostei, o mais famoso é de facto Agustina, o que mais gostei foi a Quinta Essência que já falei aqui: http://geocrusoe.blogspot.pt/2014/05/a-quinta-essencia-de-agustina-bessa-luis.html