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sábado, 12 de abril de 2025

"canção para ninar menino grande" de Conceição Evaristo

 

Citação

"o mais sagrado de uma mulher pode-se encontrar para além de seu corpo"

Acabei de me estrear na escritora afro-brasileira Conceição Evaristo, com o seu mais recente romance "canção para  ninar menino grande". Depois de ter lido referências a esta autora no blogue de uma amiga e de ter ouvido uma entrevista cheia de ternura e compreensão, mas não submissão de Conceição Evaristo na RTP, a curiosidade levou-me a comprar este livro e foi uma boa decisão.

Fio Jasmim, um menino bonito, foi preterido no teatro da escola para o papel de príncipe a favor de um colega branco. A secundarização leva-o a uma grande necessidade depois de conquistar e ser aceite pelas mulheres e, apesar de casado, do casal se amar mutuamente e de terem cerca de uma dezena de filhos, ele, na sua profissão de maquinista ferroviário, tem numerosas relações amorosas nas várias cidades a que se desloca devido à sua beleza parecer um príncipe negro. Tina, uma das mulheres que por ele se apaixonou, fez um levantamento desses casos, de quem foram essas mulheres e como caíram nos braços com conquistador e contou-os ao narrador. A lista vai até ao momento em que Fio descobre que é possível estabelecer uma amizade com uma mulher diferente que vai muito além de ela ser um mero troféu sexual para exibição pública da virilidade e aceitação social.

O texto tenta juntar as sensações da vida com a arte da escrita, num processo que a autora intitula de "escrevivência", um modo, que sem tocar no realismo mágico, leva a situações extremadas do comportamento humano pela magia dos sentimentos, este modelado por mitos sociais do que é a relação sexual, sentimental e social. Conceição Evaristo, sem ser incisiva, toca os preconceitos que existem na diversidade racial e de género de um modo didático, humanista e poético. 

Um bom pequeno romance em torno deste Don Juan, bastante fácil e agradável de se ler. 

sábado, 5 de abril de 2025

"Campo Pequeno" de João Pedro Vala

 

Acabei de ler "Campo Pequeno" o meu primeiro livro do português João Pedro Vala, o romance vencedor do prémio literário Wook deste ano: a livraria on-line onde compro a larga maioria dos livros que adquiro e leio. Confesso que foi a curiosidade deste prémio que me levou a encomendar, até porque  esta obra venceu o galardão perante a magnífica obra que li imediatamente antes.

Um conjunto de pequenos capítulos, que parecem pequenas bagatelas de escrita criativa, rebuscada e de sabor contemporâneo que vão apresentando numerosas personagens que circulam em torno de um casal, Laura e Heitor, que espera e terá um filho, Tomé, com as suas ansiedades e inseguranças da vida, da ocasião e das vivências diárias comuns e acidentais e com os seus tiques individuais.

Assim, apresenta-se neste livros três gerações dos familiares próximos do casal central da obra, mulheres inseguras, vítimas do machismo, sadomasoquistas, homossexuais, gente comum anónima e até um Gengis Khan local que conduz ao resumo biográfico do histórico e o próprio escritor que entra e intervém na narrativa.

Reconheço que os parágrafos são literariamente ricos, são como bagatelas intrinsecamente belas cujo conjunto compõe uma obra completa, mas resulta numa história sem profundidade, num texto mais feito para agradar críticos e júris literários do que escapar à mediania do panorama literário de muitas obras editadas presentemente que depois de lidas caem com o tempo no esquecimento.