"História da Menina Perdida" de Elena Ferrante corresponde ao quarto e último volume da tetralogia "A amiga genial" e completa a história de uma amizade de vida inteira vista pelos olhos da amiga que se tornou culta e escritora mas que nunca deixou de ter uma admiração e até talvez um complexo de inferioridade face a outra companheira que apesar de não ter tido a mesma oportunidade de estudo lutou com todas as forças para sobreviver, ascender socialmente e revoltada criar um mundo à sua medida à sua volta e enfrentar dificuldades pessoais difíceis de ultrapassar.
Neste livro, após uma primeira metade ainda muito novelesca com amores e ódios, percursos políticos e sociais, bem como conflitos típicos da cidade berço da obra, não só das personagens que acompanhámos nos volumes anteriores, mas também agora dos seus filhos que assim passam de crianças a adolescentes a jovens; segue-se uma segunda parte mais instrospetiva, madura, com reflexões sobre a vida e marcada pelas desilusões, visualização da repetição dos mesmos erros nos mais novos após o calo e o saber dos mais velhos, as relações sociais, a amizade, os problemas socioeconómicos dos desfavorecidos, a corrupção económica e social na Itália e uma descrição nostálgica do que é Nápoles, bem como as mudanças de estilo de vida desde os anos 1990 até à atualidade fecham o ciclo.
Ideologicamente o livro já não promove um idealismo de esquerda, neste campo também com o tempo muitos se acomodam e torna-se evidente que certos ídolos tinham pés de barro e eram oportunistas de uma classe com privilégios que não estão dispostos a prescindir, apesar do discurso solidário. A escrita também se adapta à idade da pretensa narradora, tornando-se ela mesmo mais madura.
São inclusive dadas explicações do essencial da obra de uma forma indireta, isto quando se abprdam o conteúdo de publicações da narradora a falar da amizade, surgindo assim objetivos dos livros dentro do livro que não são mais que a tradução dos da tetralogia, numa perspetiva de alguém que os expõe arreigada a valores humanos fortes, mas libertos de tabus religiosos e pudores tradicionais muito característicos de alguém que viveu a revolução sexual dos anos 1960/70. Valeu a pena a maratona.