Voltei à minha coleção, que possuo há mais de 30 anos, das obras completas de Eça de Queiroz, da qual já li os romances, mas falta-me ainda vários volumes com outros tipos de obras.
Agora coube a vez ao volume dos "Contos", coletânea que está também disponível no mercado noutras edições, como esta aqui. São 23 histórias que retratam situações contemporâneas da época de Eça e históricas que vão da idade média, ao tempo de Cristo que chega a personagem, recua até Odisseu e vai ao primeiro homem e mulher que, claro, são Adão e Eva, mas que pouco têm com os do génesis bíblico.
Os contos contemporâneos têm temáticas diversas, que vão desde o "Réu Tadeu", que se descobre ter morto o irmão, se dá por culpado e tem um comportamento exótico; até paixões que levam aos atos extremos de José Matias ou ao racional em "Singularidades de uma rapariga loura", à exaltação da natureza em "Civilização", talvez um ensaio que deu origem ao genial romance de "As cidades e as Serras" e passa por fundamentos do insucesso de Portugal em "A catástrofe", entre outros. Em muitos deles sente-se o espírito satírico e mordaz de Eça nos seus grandes romances mas aqui em obras curtas.
Os históricos vão desde o terror fantástico em "O defunto" ou selvático de "Enghelberto", prolongando-se para os deprimentes ambientes religiosos medievais com o peso da obrigação de pureza para a salvação, até um Jesus, bem mais leve, amigo dos pobres que desprezo os poderosos em três versões de "O Suave Milagre", mostra a superioridade do amor humano imperfeito humana face à "Perfeição" dos deuses e questiona o legado de "Adão e Eva no paraíso". Nestes contos, a temáticos de alguns levou a que o tom de Eça mudasse e a sua narrativa parece-me, por vezes, menos conseguida, se gostei muito de algumas destas histórias, noutras senti-as demasiado constrangedoras e deprimentes.
Todavia, a coletânea vale bem a pena de ser lida, pela qualidade, perfeição e riqueza de escrita, que é transversal a todos os contos, apesar de dois ou três deles terem ficado incompletos.