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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

"A gaivota * O tio Vânia * Três Irmãs * O Ginjal" de Anton Tchékhov

 

Excertos

"Pois é, chego cada vez mais à conclusão de que o problema não são as formas velhas ou as formas novas, mas precisamente o que escrevemos, sem pensarmos em quaisquer formas, escrevemos porque isso jorra livremente da nossa alma." A Gaivota.

"É assim a vida, não há nada a fazer. Tudo o que nos parece muito importante, com muito significado, muito sério - há-de chegar um tempo em que é esquecido, ou que não parece importante." Três Irmãs.

Terminado o mês em que talvez menos lí nas últimas décadas, mas coincidente com o que mais teatro li, logo no início deste acabei de ler o livro do escritor russo Anton Tchékhov que reúne quatro peças de teatro: A Gaivota, O Tio Vânia, Três Irmãs e O Ginjal

Em A Gaivota, numa casa de família cruza-se uma atriz com passado glorioso com seu filho jovem pretendente a escritor melodramático em busca de novas formas e visitantes que vão desde um escritor consagrado, uma pretendente a atriz e gente entendida no mundo das letras. Ao longo da trama apercebemo-nos das invejas e hipocrisia dos estabelecidos e das inseguranças e sonhos dos mais novos até à sua desilusão, podemos dizer que é uma peça de teatro a  interrogar-se sobre esta arte, os males do meio e os riscos e necessidades de inovação, sem dúvida questões caras ao autor.

N'O Tio Vânia temos gente comum num espaço familiar com desconfianças mútuas sobre os úteis, acomodados e oportunistas e necessidades de mudança de comportamento e incertezas. Uma peça que reflete sobre gente comum de famílias históricas em declínio, um retrato social da Rússia pouco antes da revolução e onde estão subentende aspetos do fim do império monárquico para o soviético.

Nas Três Irmãs, é uma história de gente comum e passa-se na casa de família destas com um irmão mais velho que passa de esperança de todas para a desilusão. Esta situação permite discutir com amigos e dissertar sobre as dificuldades do presente como potencial trampolim e construção de um futuro glorioso, mas incerto e longínquo da humanidade.

N'O Ginjal numa quinta familiar de aristocratas em queda, veremos o declínio da classe dominante no passado a ser ultrapassado pelos investidores capitalistas que pisam a tradição e a cultura para progredir e enriquecer, expelindo despudoradamente os senhores do passado em benefício individual.

Todas as peças mostram Tchekhov a testar novas formas de teatro, retratos de época e a questionar as mudanças de valores, da arte e os conflitos da sociedade de então através de gente tipicamente da Rússia rural da classe antes dominante ou da cultura e em conflito com as novas personalidades. São obras de vanguarda, mas fáceis de ler pela linguagem comum das personagens, só que ainda hoje parecem diferentes do teatro tradicional. Alguns dos atores por vezes debitam textos extensos para construir conceitos perante outros que perturbam e entram e saem de cena como nos momentos de tensão dos romances de Dostoievsky e, tal como este, as perguntas ficam no ar, cabendo ao espetador/leitor questionar-se. Gostei muito.

4 comentários:

ematejoca disse...

Vi as 4 peças do dramaturgo russo várias vezes.
Absolutamente um „must“.

ematejoca disse...

Vi as quatro peças do dramaturgo russo várias vezes.
Absolutamente um „must“.

Pedrita disse...

eu li a gaivota. preciso terminar de ver um filme q mostra um grupo de teatro montando a gaivota e a relação entre o grupo. chega a ser estranho o qt esses textos são atuais.
o livro https://mataharie007.blogspot.com/2013/03/a-gaivota.html
beijos, pedrita

Carlos Faria disse...

Pedrita
Mais de um século depois os texto podiam ser escritos hoje, apenas o enquadramento cénico necessitava de atualização.

Ematejoca
Apesar de ter gostado, não deixa de por vezes ser incómoda as questões levantadas e os textos ainda são arrojados presentemente.