Acabei de ler o romance premiado com o prémio de Literatura da União Europeia em 2010 e escrito por Goce Smilevski da Macedónia "A irmã de Freud".
O livro ficciona as memórias de Adolfine, irmã do psicanalista Sigmund Freud, a única que não se casou e teve problemas de adaptação social e psicológicos. No início da obra, vemos que Freud quando escapou do regime nazi em Viena e partiu para Londres, viagem assegurada por corredores diplomáticos, excluiu da sua comitiva de pessoas a salvar as suas irmãs, tendo estes familiares morrido nos campos de extermínio.
Adolfine, que tivera um relacionamento na infância muito próximo e intenso com Sigmund, vai então recordar toda a sua vida desde a criança até à câmara de gás: descobrimos a hostilidade da mãe por ela ser diferente; lemos uma paixão secreta com um infeliz adotado; partilhamos a amizade com a ativista feminista Klara Klimt, irmã do pintor com o mesmo apelido e perseguida socialmente; a apercebemo-nos dos comportamentos disfuncionais e sofrimentos na família Freud; compreendo-mos o refúgio da protagonista numa clínica psiquiátrica com Klara; e vmos ainda nos surpreender com o encontro no campo de concentração com uma irmã de Kafka. Sendo um romance não sei exatamente onde começam os factos e entramos no mundo ficcionado.
Toda a obra é um desfile filosófico sobre questões das origens e das necessidades psicológicas da crença, se esta cobre a necessidade humana de justiça num mundo injusto, se o comportamento social e individual é para fundamentar o fim da vida ou dos traumas do inconsciente, sobre o que é a normalidade e a loucura e as razões desta, bem como muito do pensamento de Freud que, apesar de ser o pai da teoria da psicanálise moderna, é alguém cheio de falhas e de comportamentos disfuncionais dos quais Adolfine terá sido uma vítima e não uma louca, mas sim um exemplo de racionalidade que questiona Sigmund.
O texto é todo ele um poema permanente, mas atravessado constantemente pela tristeza, solidão e as incertezas das razões de se viver neste mundo. As descrições do comportamento na clínica psiquiátrica e do que é a loucura, bem como a permanente insatisfação de Adolfine neste mundo disfuncional e a definição do que será a morte estão cheias de beleza, aliás, esta última é o consolo da vida segundo o livro. Freud não fica bem no romance e as personagens normais parecem bem inferiores do que a inadaptada e infeliz Adolfine.
Gostei do livro, da escrita e das inúmeras questões levantadas... mas não deixa de ser uma obra cuja leitura transporta uma beleza que dói ao leitor.
7 comentários:
não conhecia, parece instigante. bela capa. beijos, pedrita
Um livro cheio de poesia na escrita a fazer interrogações através da memória de uma vida sofrida
Nossa que romance interessante. Gostei muito da resenha.
Parece ser interessante.
Aproveitava para perguntar se já leu e se gostou do livro de Margaret Atwood, Alias Grace. Boa noite.
Kelly
Um amigo meu disse-me que no Brasil só estava disponível em ebook, não sei se tradução portuguesa ou brasileira-
Joaquim
Uma obra forte, mesmo triste.
Sim, Já li há muitos anos Alias Grace, baseado numa história real e de uma potencial criminosa. Então gostei.
Pois queria ter acesso a essas edições portuguesas.
Enviar um comentário