Há muito que não navegava pela prosa poética de António Lobo Antunes: uma malha de frases que cruza os lugares, o tempo, as personagens, os diálogos e os pensamentos sobre a realidade e a imaginação num fluxo contínuo com um lirismo cuja estória e o enquadramento se vai montando como um puzzle no decorrer da leitura, que por esta mistura não é fácil e exige mesmo esforço aos mais habituados.
Confesso que continuo a admirar e a gostar muito da escrita de António Lobo Antunes, este livro não foi exceção, mas aqui a compreensão da narrativa foi mais lenta, talvez por que quase tudo é exposto perto do início e depois vai sendo reexposto em forma de variações, mas sempre com o mesmo carácter obsessivo, como uma esfera de espelhos rotativa que vai refletindo as mesmas imagens da envolvente, embora com alterações no nosso olhar.
Já li livros mais deprimentes que esta insónia, onde a morte está sempre presente, escolhe os personagens, perde-se entre eles e esquece-se de outros.
Embora com uma escrita e narração bem distintas, frequentemente lembrou-me "O Som e a Fúria" de Faulkner que li recentemente. Também aqui uma família rural que procura sobreviver à sua decadência, também a visão dos seus vários membros: criados, amantes, assassinatos/suicidios, também a importância de uma personagem central portadora de deficiência mental - neste caso autismo - uma estabilidade que se desmorona com o tempo à medida que a casa/quinta se vai degradando ou as pessoas se afastam dela.
No fim gostei, não foi o meu favorito de Lobo Antunes, mas continuo a admirar-me como ele consegue criar imagens, parágrafos e combinações plasticamente tão belos num clima tão opressivo e obsessivo