"fundava a sua teoria da inevitável desintegração da humanidade devido à gangrena burocrática"
Após vários anos, voltei ao laureado com o Nobel da literatura Mario Vargas Llosa, agora com o romance "Travessuras da Menina Má". O adolescente Ricardo tem o sonho de viver em Paris e apaixona-se no seu colégio em Lima, Peru, por uma recém-chegada que se diz chilena e o aceita de forma fugidia, mas descobre-se que a moça bonita é uma menina má, envolta em mentiras com o objetivo de parecer alguém de classe alta e ser alvo de atenções e desmascarada desaparece. Muitos anos mais tarde, Ricardo torna-se tradutor da UNESCO em Paris, faz um amigo peruano que recruta compatriotas para formação revolucionária em Cuba, entre estes surge a chileninha. Ressuscita a paixão que a menina má alimenta do forma fugidia, vai para Havana e torna-se amante de uma chefia guerrilheira, eis a a vocação da mulher: buscar alguém que lhe dê um estatuto social para ter vida de rica. Inventa passados falsos, mas todas as suas conquistas acabam mal e tem sempre à espera Ricardo, o seu menino bom, que a ama e a acolhe nos interregnos de nova fuga. Uma sucessão de casamentos e amantes em capítulos, décadas, países e cidades diferentes que construirão as memórias da vida de Ricardo que por amor nunca singrou verdadeiramente na sua vida.
A obra, bem escrita e com uma história bem narrada, origina uma trama ao estilo de novela com um amor difícil do protagonista vítima da menina má. O romance vale, sobretudo, porque cada capítulo faz um enquadramento histórico, geográfico social e cultural, assim assistimos sucessivamente à vida dos adolescentes num bairro de classe média alta em Lima na década de 1950, depois a expansão dos ideais da revolução cubana nos anos seguintes na América Latina vistos a partir de uma Paris, que é então o epicentro da cultura mundial com escritores e filósofos como Camus e Sartre, a admiração internacional da canção francesa e do cinema de autor como Truffaut. Depois, tudo muda para Londres entre a década de 60 e 70: o movimento hippie, a minissaia, os Beattles entre outros agentes da revolução cultural de então, uma das páginas que mais gostei do livro. Mas as aventuras da menina má em seguida saltam para uma Tóquio hiper-higienizada e de sentimentos escondidos mas capaz de realidades extremas que chocam. Para se avançar para tempos mais próximos onde é menos evidente a diferença dos costumes face ao presente, um centrado na esperança e desilusão da evolução política do Peru, outro em Paris e o último que mostra a abertura à cultura de Madrid após a ditadura, momento em que a história tem um fim.
Um livro fácil de ler, por vezes cansa a subserviência por amor do narrador à menina má, mas que se torna interessantíssimo por mostrar a evolução cultural no hemisfério ocidental e apontar por alguns dos nomes da literatura mais importantes da Rússia, pelo que se torna um magnífico guia nestes assuntos.
Olá Carlos! Feliz 2023! Que seja um ano abençoado e de muitas leituras boas.
ResponderEliminaresse desse autor eu não li. beijos, pedrita
ResponderEliminarEm primeiro lugar quero desejar-lhe um bom ano com excelentes leituras.
ResponderEliminarO Carlos valorizou mais nesta obra de Vargas Llosa o seu enquadramento histórico, geográfico, social e cultural; eu, ao invés, foquei-me mais no tema central - o amor - e não quis sair dele, o resto foi pura paisagem para mim.
E digo isto porque o tema do amor aqui tratado, assume tantas cambiantes que foi um autêntico tratado: paixão e distância, sorte e destino, dor e prazer… Qual será o verdadeiro rosto do amor?
Sempre imaginamos o amor como um presente mágico, mas nem todo mundo consegue ficar no lado mágico do amor.
Gostei muito deste livro.
Joaquim
ResponderEliminarobrigado pelos votos, a parte do amor neste livro li-a como mais uma das muitas facetas que este sentimento pode ter quando toma a forma de paixão, uma novela bem narrada. Gostei mas não me marcou.
O enquadramento geográfico, político, cultural e histórico ensinaram-me pormenores que são contemporâneos da minha vida e por isso a análise nem sempre conseguimos fazer de fora, o que Llosa fez bem neste livro à luz dos seus olhos e foi o que me marcou mais.
benevolentes é maravilhoso mesmo. mencionei sua postagem na minha. beijos, pedrita
ResponderEliminarfalei de livro novamente.
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