Citações
"Mas que sei eu sobre Deus? Não sei nada. Se somos feitos à sua imagem, então Deus não deve ser grande coisa ou, se for parecido comigo, é feio como a noite dos trovões."
"Cada um tem o seu deus, a sua maneira de acreditar no infinito."
"O medo impede-nos de acreditar naquilo que o medo nos diz que é impossível."
Voltei à leitura do escritor português contemporâneo, João Tordo que venceu o prémio literário José Saramago, destinado a laurear jovens que escrevem em português. "Ensina-me a voar sobre os telhados" uma narrativa em dois lugares, Lisboa e Japão e atravessa gerações.
No liceu Camões um professor suicida-se e deixa o corpo docente em estado de choque, um deles - ex-alcoólico cujo vício destruíra a sua relação familiar e membro dos alcoólicos-anónimos - decide então organizar um grupo de reflexão do cariz semelhante na escola para exorcizar as tensões desta morte, ali desfilam problemas e ansiedades. Mais tarde, ao abrir-se as reuniões a mais gente, surge um luso-japonês de comportamento estranho e sarcástico, que se aproxima do fundador. Este desenvolve uma relação de proteção ao nipónico que sofre de distúrbios, o que lhe vai gerar novas tensões entre a ânsia de o ajudar e a sua vida pessoal. O romance intercala a história problemática da família Tsukuda no Japão, temperada por abuso de poder, egoísmos e a obsessão de quererem levitar, objetivo que atravessou gerações até ao psicótico Henrique, um comportamento com vítimas e punições que ameaça destruir o professor viciado em ajudar, enquanto reflete sobre a vida real, o papel de deus e a infelicidade das limitações da humanidade e até do demónio.
Tordo tem uma escrita magnífica, poética, cheia de metáforas inovadoras e intercala a narrativa com reflexões sobre a vida contemporânea, os anseios e os receios da humanidade. Nesta obra, além de uma permanente sombra sobre tudo o que move as pessoas e as limitações do homem, tecem-se, pontualmente, considerações sobre as angústias das personagens que vão desfilando no romance, que talvez seja extensiva ao demónio representado pelas figuras de Doré, ou até a deus ou aos deuses, que estão limitados pela incapacidade de se libertarem pela morte.
Gostei muito de voltar a João Tordo e se no anterior livro iniciei com perspetivas muito elevadas não superadas, neste foram as minhas perspetivas ultrapassadas, em comum há uma certa angústia existencialista, mas considero "Ensina-me a voar sobre os telhados" um excelente romance que nos faz pensar sem impor nenhuma resposta.
nossa, fiquei interessada. um tema q me interessa. eu li uma obra desse autor por sua indicação e gostei muito. anotado esse. beijos, pedrita
ResponderEliminarNunca li nada do João Tordo, no entanto, a sua análise literária deixou-me curiosa e o título é também prometedor.
ResponderEliminarEntre a geração dos jovens escritores em Portugal, para mim João Tordo talvez seja aquele que melhor equilibre criatividade de escrita, narrativas consistentes e temas atuais para reflexão sem ser taxativo nas mensagens que passa nas suas obras.
ResponderEliminarOlá Carlos! Tenho vontade de ler esse autor. Gostei da sua resenha.
ResponderEliminarAinda li pouco dele, mas este, sobretudo, deixou-me muito bem impressionado.
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