Acabei de ler o romance "As Aventuras de Augie March" do escritor nascido no Canadá que adquiriu a nacionalidade Norte-americana e vencedor do prémio Nobel da Literatura.
A obra é a autobiografia de Augie que a narra desde criança, quando viveu num bairro pobre de Chicago na década de 1920, até homem estabelecido socialmente e a viver no centro de Paris. Filho de mãe abandonada, com um irmão mais velho e outro mais novo com atraso mental e a partilhar o apartamento com uma anciã aristocrata fugida à revolução russa, ali acolhida para suportar os encargos da família carecida de dinheiro. Do amor à mãe lutadora aos conselhos da idosa autoritária que reconhece potencial nos irmãos mais velhos, o protagonista desenvolve a vontade de viver entre gente rica mas sem perder a sua liberdade individual. O seu aspeto atraente conjugado com o ar de filho abandonado inspiram os endinheirados a acolhê-lo e a adotarem-no, algo não muito diferente ocorre ao nível de mulheres bonitas. Numa vida comparada com a do irmão, que sobe mais rápido acomodado às exigências dos objetivos, Augie, além dos passos rebeldes da infância de bairro, segue uma luta de resistência aos seus protetores sempre que implique cedências pessoais, desperdiçando oportunidades flagrantes na sua alma rebelde à subserviência e por vezes passando por situações arriscadas com a lei, com a vida e com os seus grandes amores, mas sem nunca se desligar da necessidade de proteger as fragilidade do irmão mais novo e da mãe que vai cegando.
As aventura e desventuras de Augie são magníficas. Os retratos de Chicago pobre, do pequeno banditismo, dos efeitos da depressão e do modo de criação de fortuna em certas famílias são excelentes. O exotismo de certas personagens e das cenas passadas no México é fabuloso. Além das numerosas referências à cultura clássica e a personalidade da história da Europa e da América numa coletânea que demonstra o elevado nível cultural do autor. Todavia, o texto muitas vezes estende-se por numerosos pormenores e uma adjetivação excessiva que para mim o tornou demasiado extenso, nalguns momentos mesmo fastidioso de tão prolixo.
Por tudo isto, apesar de ser uma excelente história, confesso que para mim teria sido um magnífico romance se o autor tivesse tido a vontade de sintetizar e de cortar os excessos para que as mais de 700 páginas em letra miúda tivessem passado a cerca de 500 com uma dimensão agradável à leitura. Um bom romance que sei de leitores que desistiram cedo e por isso perderam muitas destas excelentes aventuras, mas a obra exige mesmo alguma resistência ao exagero de palavras.
A prosa desse livro é exuberante, de longos períodos, whitmaniana e muito elétrica e bela, sendo quase uma antítese ao estilo que o autor adotaria nas próximas obras (com as frases curtas e a concisão mais cinzelada de romances como Herzog e O legado de Humboldt). Concordo com você: algumas páginas a menos e estaríamos com um livro menos exaustivo. Mas, ao mesmo tempo, esse romance, que li três vezes, me toca fundo e eu não saberia quais páginas eu retiraria dele_ talvez a cena do naufrágio. Creio que esse excesso foi proposital da parte de Bellow, que queria um livro exultante e grandioso. A força dele talvez esteja em sua gratuidade, que desde o início o narrador admite que será como ele escreverá. O que cria capítulos maravilhosos, como o antológico capítulo sobre a caça da águia_ que Philip Roth diz que está entre as páginas mais sublimes da literatura norte-americana.
ResponderEliminarConcordo que todas as páginas em torno da águia e no México são fenomenais, não sei porquê, mas senti-me no Quarteto de Alexandria de Durrell. Também não gostei do naufrágio, embora a personagem do cientista louco até tivesse potencial, mas não dá elã ao livro.
ResponderEliminarAdorei Humboldt, talvez seja por essa concisão e depois de Zweig ter explicado na sua autobiografia o seu esforço de concisão na sua obra literária passei talvez a valorizar mais ainda esta técnica.
Tenho vários livros de Saul Bellow na estante e nunca li nenhum.
ResponderEliminaresse eu não li, e que capa. eu sou aficionada em livros longos e já me interessei. mas aí é gosto mesmo. mas concordo, nem todo livro longo fez sentido. beijos, pedrita
ResponderEliminarEmatejoca
ResponderEliminarEu já li vários, O Legado de Humboldt gostei muito, Herzog penso ser o mais conhecido dele, já ouvi falar muito bem de Ravelstein.
Pedrita
Sim, acho esta capa encantadora e ternurenta, talvez a ideia do Augie criança e pobre. Há obras que precisam de ser longas, há outras que não, esta penso que não precisava de ser tão extensa.
Não conhecia Carlos. Gostei dos comentários. Parabéns por ter enfrentado o calhamaço.
ResponderEliminarKelly
ResponderEliminarHá obras grandes que pelo ritmo interno não cansam, esta por ser tão densa na escrita implicou esforço, mas a biografia até era interessante.