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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

"Babbitt" de Sinclair Lewis

Excertos
"A extraordinária, crescente e salutar estandardização das lojas, escritórios, ruas, hotéis, roupas e jornais através de todos os Estados Unidos mostra como o nosso modelo  de vida é forte e duradoiro."

"O cerne da sua religião era que era respeitável e benéfico para os negócios ser visto a frequentar a igreja; que a igreja impedia os elementos maus de se tornarem ainda piores..."

Terminei a leitura de "Babbitt" do norteamericano Sinclair Lewis, o primeiro escritor deste país a receber o prémio Nobel da literatura. Tanto a capa da imagem como a tradução não correspondem à da edição que li, pois o livro que comprei obtive-o num daqueles vendedores de obras usadas comuns em estações de transportes públicos em Lisboa e deduzo que o exemplar deve ter acompanhado uma coleção associada a um jornal ou revista com autorização da já extinta Difel.
Babbit é um agente imobiliário de sucesso, vive bem e acomodado à filosofia conservadora da ideologia capitalista dos EUA numa cidade imaginária (Zenith) de média dimensão, mas com problemas de choque de gerações em família devido a filhos mais progressistas e a uma mulher tradicional.
Babbit tem amigos e é membro das associações próximas do poder e neste meio envolve-se nos esquemas para os elementos pertencentes à classe dominante tirarem proveito das políticas públicas e opções estratégicas de gestão de Zenith. O seu grupo enfrenta a luta para erradicar a propagação de ideias mais igualitárias, reivindicações sindicais e teologias que defendam os mais fracos, ou seja, os considerados derrotados da sociedade por culpa prória, mas cujos sacrifícios e dificuldades servem de suporte aos senhores e seu bem-estar. Só que Babbit no seu coração tem ideais de justiça, simpatias por questões sociais e anseia por alguns prazeres, tentações que a seguir a sua vontade poderá ter de pagar muito caro face à pressão do meio que o cerca.
O romance tem uma evolução quase linear do dia a dia de Babbit e com isso faz um retrato, com um humor sarcástico e frio, do egoísmo e oportunismo da classe capitalista e dos empresários em ascensão na década de 1920 durante a lei seca. Insinua as estratégias dos dominadores para preservarem o seu comodismo, enriquecerem e esmagarem os argumentos de esquerda. Não se esquece de criticar as numerosas religiões criadas à medida dos interesses de grupo que proliferam no País e ainda é mordaz com as preocupações da moral puritana de então. É uma obra marcadamente de esquerda e agnóstica, embora estes dois mundos sejam denunciados pela hipocrisia dos ricos bem comportados, oportunamente "crentes" e de direita.
A escrita sem grandes artifícios de embelezamento é realista e ombreia com o tom de crítica irónica da sociedade que o autor quis retratar através dos ziguezagues, anseios e receios de Babbit e o romance vale sobretudo por essa caracterização e mordacidade das desumanidades do regime típico dos EUA. Um romance de fácil leitura que surpreende até à última página.

6 comentários:

  1. Deste autor, já li Main Street (a vida de uma mulher da cidade em "small town America") e It Can't Happen Here (sátira política que roça a distopia, sobre - imagine-se! - um candidato populista a ascender ao poder nos EUA). Recomendo ambos imenso, ambos excelentes leituras. Este será o meu próximo livro do autor.

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  2. eu li faz tempo e gostei demais. beijos, pedrita

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  3. Bárbara
    O segundo que referiu parece-me mais cativante, veremos.

    Pedrita
    A estória para mim é mais interessante que a escrita, tendo em atenção que é um Nobel, mas é um bom romance.

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  4. Oi Carlos,

    acredita que a minha edição também é antiga e chegou em minhas mãos por um amigo que o recolheu num lugar de troca de livros? Não sabia nada sobre o livro até ler suas impressões, obrigada!.

    Abs.

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  5. O Main Street é um belo retrato social da América, enquanto que It Can't Happen Here (já traduzido em português, no ano passado) é mais político, satírico. Ambos excelentes.

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  6. Kelly
    Eu sabia da existência da obra Babbitt pois foi reeditada recentemente em Portugal por uma editora que publica obras antigas por crowdfunding que acompanho, mas desconhecia o seu conteúdo, mas interessei-me mais por o autor ter recebido o Nobel, ao vê-la a muito bom preço comprei-a. Agora já sei.

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