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sexta-feira, 28 de junho de 2024

"O Intruso" de Stephen King

 

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 "O universo não conhece limites"

Ao fim de muitos anos regressei a um dos escritores de maior sucesso das últimas década, o americano Stephen King e procurei uma obra relativamente recente que juntasse dois dos ingredientes para tal popularidade: literatura de ficção policial e de terror e optei por "O Intruso".

Ralph Anderson decide prender em pleno estádio e durante um jogo de final dos escalões juvenis o seu treinador, um muito popular da cidade: Terry Maitland, pelo assassínio e violação com extrema violência de uma criança. Todas as provas se conjugam para ser ele o criminoso: testemunhos na zona próxima do crime, câmaras de vigilância, impressões digitais e evidências de sangue nas suas roupas. Só que pouco depois o advogado de defesa consegue evidenciar que Terry estava a mais de 100 km e de novo câmaras, testemunhos e impressões digitais asseguram essa realidade, mas em auxílio da polícia vêm as perícias  laboratoriais como o ADN que o levam a levar ao juiz quando um atentado justiceiro termina na morte do potencial culpado. Como explicar a ubiquidade do criminoso? Anderson não fica satisfeito e um conjunto de incidentes agrava tudo, só que o trabalho detetivesco vai evidenciar uma realidade para além do normal, que ultrapassa o natural, é uma luta contra o mal enraizado em crenças e lendas e nesta guerra há que salvar a imagem da vítima acusada, tudo indica, injustamente. Poderá Anderson vencer esta força do mal e reparar a honra que ele sujou?

A narrativa, após a prisão inicial, segue a forma de um trabalho policial clássico, com um conjunto de depoimentos e contra-argumentos da defesa intercalados com choques emocionais do lado da família das vítimas e do preso, além de dúvidas do lado dos investigadores, que são descritos por um autor que domina bem a escrita literária e expostos de uma forma consistente. Perto do meio da obra, quando subtilmente começam a surgir indícios menos naturais, a forma desliza para aspetos incríveis e as suspeitas do terror vão deslizando cada vez mais com passagens para campo do terror, não psicológico, mas paranormal e com momentos repugnantes para o final e deixa-se de estar num simples policial lógico até ao desenlace final mas num misto de ciência e paranormal.

Confesso que a parte natural de investigação da luta da acusação com a defesa me cativou, mas os argumentos lendários transportados para a realidade da narrativa esbarraram com a minha mentalidade científica que nem no campo lúdico se sente atraído, exceto em histórias mitológicas que pretendam representar grandes dilemas humanos como nos clássicos antigos ou as óperas de Wagner. Todavia, é um romance muito fácil de ler, bem escrito e acessível a todos, mas não recomendo a quem o terror o transporte para o reino dos pesadelos ou suscetível a náuseas

quinta-feira, 13 de junho de 2024

"A Premonição" de Agatha Christie

 

Acabei de ler "A Premonição", uma obra de investigação detetivesca da famosa escritora inglesa Agatha Christie, este tem como protagonistas para deslindar o mistério o casal Tommy e Tuppence, menos famosos que Miss Marple e Poirot, mas também figuram em diversos romances desta autora.
Na sequência de uma visita à Tia Ada ao lar, onde tudo parece em ordem, Tuppence conhece outra residente, Mrs. Lancaster, que lhe pergunta "era sua a pobre criança? e insinua que esta chora ainda por detrás da lareira. Pouco depois, a Tia morre e descobrem que aquela lhe ofertara um quadro com uma casa à beira de um canal de que Tuppence se lembra de ter visto antes, só que Mrs. Lancaster fora levada do lar repentinamente e limparam todas a vias de chegar ao contacto com ela. Correrá ela risco de vida? Qual a sua ligação à casa do quadro e onde ela a vira? Após descobrir o lugar e tentar saber histórias do passado daquela terra rural, Tuppence sofre um ataque que coloca Tommy também na investigação e um mistério de mortes em série no passado e uma rede criminosa são desmontados. 
A obra apresenta elementos de cultura geral artística mais ampla que os habituais romances com Miss Marple e Poirot e também é menos linear, mesmo a meio do livro não sabemos ainda se houve ou não um crime, de quem e o que procuramos, é mais uma suspeita do que um facto que coloca Tuppence com o seu faro a investigar. Por isso a trama evolui calmamente em meio rural inglês conservador, só que o mistério vai-se adensando até se tornar claro que de facto algo deve ter acontecido e com ajuda do o marido com a sua experiência de ex-agente secreto que ambos deslindam o caso. Gostei, apesar de não ser um policial dos mais típicos da escritora 

sábado, 1 de junho de 2024

"À Espera da Subida das Águas" de Maryse Condé

 

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"Mas não é preciso ser perfeito para ser amado. Caso contrário, o amor seria uma recompensa e não um milagre."

Li pela primeira vez uma obra da Maryse Condé, francesa, natural da ilha de Guadalupe, é considerada a maior escritora da Caraíbas, com obras que falam das feridas do colonialismo, da escravatura, das guerrilhas e miséria nas Antilhas, "À espera da subida das águas", estende este tema à África francófona e ao Médio-Oriente nas últimas décadas. 

Babakar é um obstetra formado em Montreal, vive em Guadalupe em solidão enquanto vai atendendo grávidas, recorda uma amizade universitária, África onde nasceu e assistiu às devastações de uma guerra civil liderada pelo seu amigo e um amor perdido. Entretanto sua mãe falecida dá-lhe conselhos e avisos em sonhos. Numa noite tempestuosa é chamado a um parto de uma imigrante haitiana clandestina que morre, adota a criança, mas um companheiro da defunta informa-o que têm de ir para o Haiti com a bebé encontrar a família para a morta ter descanso. Decide seguir o conselho e partem para uma terra de pobreza, de anarquia e conflito e estabelece-se neste caos, cria magníficas amizades, com um "libanês" e outras personagens ligadas à política tirana do pais que vivem naquele estado falhado e procura o melhor para a sua filha.

O romance tem uma estrutura que inclui várias biografias das principais personagens da obra e assim assistimos a diferentes histórias paralelas que completam o evoluir da trama e expõem os problemas de uma guerra civil e ditaduras em África, da guerra no Líbano, do legado da escravatura e do caos em que se transformou o Haiti nas últimas décadas, além das feridas do colonialismo.

Num estilo que paira entre o realismo mágico e as crenças da religião vodu com mistura de vivos e mortos, assiste-se ao milagre da resistência da amizade e do amor às dificuldades de se viver em terras devastadas pelas tensões humanas e as catástrofes naturais.

Apesar do desfile de agruras, não é um texto triste, uma certa leveza e humor atravessa as dificuldades e tempera a obra que se torna agradável de se ler enquanto mostra os problemas das terras por onde Babakar e outras personagens vivem. Gostei e recomendo.