O romance "O Plano Infinito" de Isabel Allende, já tem 25 anos, não se integra bem no realismo mágico que então se associava a esta escritora do Chile, embora este esteja presente. Relata a vida difícil, conturbada e por vezes desorientada e amoral do protagonista: Gregory Reeves, filho de imigrantes nos Estados Unidos - um pregador inicialmente ambulante de uma religião por ele inventada (O plano infinito) vindo da Austrália que por doença se fixa num bairro de latinoamericanos pobres da periferia de Los Angeles onde morre deixando-o órfão e a família dependente da ação social e duma russa que o repele - complementado pelos principais episódios de vida daqueles que se cruzaram com ele e foram marcantes na sua viagem da miséria até um posicionamento social médio a alto e fizeram caminhadas diferentes de sobrevivência, uns explorando a superstição e magia, outros o exótico e ainda outros sem nada de destaque ou igualmente esmagados pelas pressões da sociedade.
Por vezes o texto é escrito na terceira pessoa no que se refere à vida do protagonista, da sua família, amigos e inimigos, como também Gregory e as suas experiências, medos, ansiedades, aventuras e desnorte, inclusive no seu relacionamento com as restantes personagens da obra é exposto na primeira pessoa.
Uma vida que começou perto do final da II Grande Guerra e penetra na década de 1980, permitindo assim posicionar Gregory no mundo do racismo contra os latinoamericanos e negros dos anos 50, assistir à revolução social e moral dos anos 60 em Berkeley com o movimento hippie, a contestação política e participação na guerra do Vietname, lugar onde se encontram algumas das páginas mais densas da obra, e entrar na euforia e ganância capitalista dos tempos de Reagan com os choques dos que entretanto se perdem pelo caminho devido à droga, ao sexo e aos desastres financeiros, bem como os sobreviventes à margem de tudo isto, mostrando a diversidade de estilos de vida na história da América durante quase meio século.
Apenas perto do final é que se faz uma reflexão mais profundo sobre as opções, oportunidades e desperdícios da vida, como um exame de consciência daquilo que fomos e porque o fomos até se encontrar o nosso lugar neste mundo. Uma obra bem escrita e acessível com momentos divertidos, outros deprimentes, mas a vida é assim mesmo.